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Casamento infantil: estudo aponta reflexos na vida de meninos e meninas

"Tirando O Véu", da Plan International Brasil, busca compreender uniões precoces a fim de construir políticas públicas que evitem o problema

Por Gabriela Maraccini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 17 fev 2020, 16h30 - Publicado em 25 jun 2019, 17h41
Adolescente grávida
 (Brazil Photos/Getty Images)
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Os casamentos infantis são constituídos, em sua maioria, por meninas que se casam com homens mais velhos. Mais de 28 mil meninos casaram precocemente, enquanto cerca de 109,5 mil meninas se uniram antes dos 18 anos, segundo o Censo de 2010. Isso reforça, consequentemente, a posição de desigualdade entre as meninas e os homens, sujeitando as garotas, por exemplo, à violência doméstica.

Os dados são apresentados no estudo “Tirando o Véu”, lançado nesta terça-feira (25) pela Plan International Brasil em parceria com a Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO). O objetivo é entender as principais causas e as consequências dos casamentos infantis – toda união, formal ou informal, em que pelo menos uma das pessoas é menor de idade.

A pesquisa foi feita como uma investigação quantitativa nacional (para recolher dados estatísticos) e regional na Bahia e Maranhão. Foram 84 entrevistas com 218 participantes no total, sendo meninas casadas e não casadas abaixo de 18 anos, mulheres de 18 a 25 anos que se casaram adolescentes, meninos não casados, maridos que se casaram com adolescentes e famílias/responsáveis. Além disso, foram ouvidos também líderes comunitários e religiosos.

“A pesquisa compara as pessoas casadas e não casadas, traz uma visão daquelas que estão em casamentos recentes e aquelas que já se casaram há algum tempo. Ganhamos na capacidade de análise das causas ao escutar também os meninos que não estão casados e os homens que se casaram com meninas”, afirma Viviana Santiago, gerente de gênero e incidência política da Plan International Brasil.

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De acordo com a Unicef, no Brasil, 2,9 milhões de casamentos infantis já foram realizados. O país ocupa a quarta posição no ranking mundial de uniões precoces de meninas e está entre os cinco países da América Latina e Caribe com maior incidência de casos. Uma a cada quatro garotas na região se casa antes dos 18 anos.

União precoce ressalta desigualdade de gênero

O estudo mostra que as uniões reforçam as estruturas sociais em que o homem está em posição de provedor, trabalhando e levando dinheiro e proteção à família, enquanto a mulher fica no papel de cuidadora da casa e dos filhos.

“O casamento infantil é prematuro, pois o início da vida conjugal é problemática para as meninas e adolescentes e concorre com outros direitos, como a educação. É também forçado, pois ressalta as desigualdades estruturais que propiciam essa realidade para meninas no mundo todo, estando bem longe de ser uma escolha ao levarmos em conta as baixas perspectivas que elas têm”, afirma Cynthia Betti, diretora-executiva da Plan International Brasil.

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Casamento infantil reforça desigualdade de gênero
Desigualdade de gênero: menina cuida da casa e dos filhos enquanto o homem trabalha. (The Washigton Post/Getty Images)

As principais consequências do casamento infantil também pesa sobre as meninas: gravidez precoce, abandono escolar e intensificação do trabalho doméstico, que acarreta na entrada tardia no mercado de trabalho – já que a falta de  profissionalização impede a chegada ao mercado formal.

Além disso, violência doméstica, despreparo emocional e psíquico, limitação dos projetos de vida e a perda de liberdade e mobilidade também foram apontados na pesquisa como consequências diretas do casamento precoce.

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Em 2016, CLAUDIA entrevistou sete garotas que se casaram antes de atingir a maioridade. Todas se uniram com parceiros já adultos, que trabalhavam enquanto elas cuidavam da casa e dos filhos. Apenas uma das entrevistadas ainda estudava na época da reportagem.

Fenômeno multicausal

A pesquisa ressalta que o casamento infantil é um fenômeno multicausal, ou seja, apresenta causas diferentes. Nas cidades baianas, as uniões foram motivadas por quatro principais causas, sendo elas gravidez; perda da virgindade; saída de lares conflituosos e amor.

Já na cidade maranhense Codó, as principais causas foram mais diversas, incluindo, além das citadas anteriormente, o desejo pela maternidade, a proteção contra a violência e a sanção da comunidade. Outra causa frequentemente relatada por entrevistados especialistas nacionais foi a vulnerabilidade socioeconômica das meninas.

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“Acreditamos que as questões mais evidenciadas no estudo – gênero e sexualidade – parecem abranger diferentes públicos e contextos, sendo difícil delimitar um grupo ou local. Por outro lado, é possível que haja pontos de concentração, a depender das características sociais, econômicas e culturais de determinados locais e grupos sociais e do nível de investimento público (ou a ausência dele) ali realizados”, afirma Daniella Rocha Magalhães, coordenadora técnica da pesquisa.

Segundo ela, agentes públicos de Codó, no Maranhão, apontaram que pode haver maior incidência de casamentos infantis em comunidades rurais e tradicionais, como as quilombolas, na cidade.

O anseio por dar início a vida sexual também foi uma das motivações citadas na pesquisa. No entanto, os jovens esbarram em obstáculos como a falta de informação sobre sexualidade e como evitar uma gravidez não desejada. Além disso, outro fator que impulsiona o casamento precoce é a sanção moral familiar e religiosa de que as meninas só podem deixar de ser virgens ao se casar.

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Com isso, há uma grande pressão social que antecipa as uniões. Consequentemente, grande parte delas acontecem depois de um período curto de relacionamento amoroso – de um mês a um ano. Entre os entrevistados do “Tirando o Véu”, apenas um casal namorava havia quatro anos quando se casou.

Leia também: Os bastidores da reportagem que foi buscar as crianças casadas no Brasil

+ Lei que proíbe casamento infantil é sancionada

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