Psiquiatras reúnem histórias reais de crianças com transtornos mentais
Livro apresenta 32 casos de crianças que enfrentaram depressão, ansiedade e autismo para romper estigmas em torno do assunto
João* tinha apenas 5 anos quando seu pai policial foi assassinado em serviço e seu avô faleceu. Nessa idade, ao invés de brincar com outras crianças, ele já havia planejado suicídio duas vezes. Ele não queria mais viver; queria reencontrar o avô. Sua mãe falava que nunca tinha visto o menino sorrir.
Essa é só uma das 32 histórias reais do livro “O menino que nunca sorriu”, do psiquiatra Fabio Barbirato e sua esposa, também psiquiatra, Gabriela Dias, em parceria com o jornalista e dramaturgo Gustavo Pinheiro. O livro reúne, em formato de crônicas, os mais emocionantes casos de crianças com transtornos mentais, como depressão, ansiedade e autismo, que foram atendidas Ambulatório da Psiquiatria Infantil da Santa Casa, no Rio de Janeiro.
“A ideia é tentar, nesse livro, tirar o estigma em cima da psiquiatria da criança, porque foi provado que a maior parte dos transtornos mentais tem origem na infância”, afirma Barbirato em conversa com CLAUDIA.
O psiquiatra comanda uma equipe de 42 profissionais no ambulatório que é referência no país. Em quase 20 anos, acompanhou de perto diferentes histórias de vida de dezenas de crianças e adolescentes com quadros de autismo, depressão ou hiperatividade, entre outros transtornos.
O que motivou ele e sua esposa a escreverem o livro foi a vontade de dar maior visibilidade a um tema que está cercado de preconceitos e estigmas. “Quanto mais se falar sobre doença mental e quanto mais se falar que elas existem, menor o preconceito”, afirma o médico.
“Precisa haver mais pessoas sem a vergonha de falar que o filho se consulta com psiquiatra. Se eu fosse ortopedista ou pediatra, as pessoas não teriam vergonha. Isso acontece porque doença mental sempre foi relacionada a ‘loucura’. O livro é para romper com esse pensamento”, defende o psiquiatra.
A importância do diagnóstico precoce
Para ele, quanto mais cedo os pais identificarem que o filho está enfrentando alguma patologia psicológica, mais eficaz e rápido é o tratamento. Ele explica, por exemplo, que, no caso do autismo, quando identificado entre os 2 e os 3 anos de idade, e acompanhado de forma adequada, com fonoaudiólogos e psicólogos, há uma taxa de 90% de evolução.
“Esses transtornos, quando identificados precocemente, servem para evitar que esses jovens, futuramente, venham usar drogas ou medicamentos”, defende Barbirato. “Com a identificação precoce, a gente consegue tratar a doença de maneira correta e evita problemas acadêmicos e sociais”.
O livro, para ajudar os pais e as pessoas que convivem com crianças com transtornos psicológicos, traz, no final de cada capítulo, dicas baseadas em evidências científicas de como notar os primeiros sinais e quais medidas tomar.
“Crianças com até 2 a 3 anos de idade, que não falam nada, que não têm intenção de brincar ou socializar com outras crianças, fornecem vestígios importantes para a procura de ajuda. São sintomas que mostram que a criança está fugindo de seu desenvolvimento”, exemplifica. “Ou quando a criança perde o interesse para brincar, perde o prazer pelo que gostava antes e apresenta uma queda do rendimento escolar, pode ser um sinal de depressão”, completa.
Histórias com finais felizes
João, o garotinho do início desta matéria, após dois anos de acompanhamento com Barbirato e outros psiquiatras da Santa Casa voltou a sorrir. Sua mãe não estava mais angustiada.
“Um dia, durante uma festa aqui no ambulatório, ele estava brincando com uma bola e eu vi a mãe dele chorando. Eu perguntei o que tinha acontecido e ela me respondeu. ‘É porque ele está sorrindo, fazia muitos anos que eu não via ele sorrir, ele brincar com tanta vontade, com tanto prazer'”, relatou o psiquiatra. “Imagina uma mãe falando isso? Que não via o filho sorrir há dois anos e ele não tinha nem sete? É um caso emblemático para mim.”
Assim como aconteceu com João, a psiquiatria infantil recuperou a vida de dezenas de crianças cujas histórias são retratadas no livro. Muitos de seus pacientes, hoje em dia, são advogados, publicitários e atores. “A grande questão é não catastrofizar, não achar que o mundo acabou”, explica.
“E uma coisa que eu acho importante é não procurar soluções milagrosas. Não existe ‘cura’. O que existe é terapia”, ressalta Barbirato.
“O menino que nunca sorriu & outras histórias reais” já está disponível nas livrarias e também nas plataformas digitais, no formato e-book. Em seu primeiro dia de vendas, no Rio de Janeiro, foram mais de 300 cópias vendidas.
“O menino que nunca sorriu & outras histórias reais”
Editora: Máquina de Livros
Páginas: 144
Preços: R$ 44,90 (livro impresso) e R$ 24,90 (e-book)
*João é um nome fictício. A identidade verdadeira do paciente foi preservada.
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