Contracepção e sexualidade: os impactos positivos do DIU hormonal
Ginecologista e obstetra, Dr. Edson Ferreira esclarece mitos e fatos sobre o uso do DIU hormonal e os impactos no desejo sexual
Dentro do contexto de saúde reprodutiva e sexual, o uso de contraceptivos hormonais tem sido amplamente debatido. Entre os vários aspectos discutidos, a influência desses métodos no desejo sexual das pessoas com útero é um tópico recorrente, que ainda gera muitas dúvidas e receios. Contudo, ao contrário de algumas crenças populares, há evidências científicas significativas que indicam que métodos anticoncepcionais hormonais – como o Dispositivo Intrauterino (DIU) liberador do hormônio levonorgestrel – não têm impacto negativo na função sexual, podendo até promover mais liberdade e satisfação sexual.
DIU hormonal afeta a libido?
Primeiramente, é importante esclarecer que a “libido”, termo comumente utilizado para descrever o desejo sexual, pode ser influenciada por uma ampla gama de fatores. Dentre eles, os hormônios, a saúde física e o estado emocional dessa pessoa, se ela utiliza alguma medicação com possíveis efeitos adversos, bem como o momento do relacionamento em que ela está e o status das relações nas mais diferentes áreas de sua vida (como profissional, familiar, social etc.).
Trazendo ao debate a influência da utilização dos DIUs hormonais, diferentes estudos da literatura científica apontam que esses métodos, ao contrário do que muitos acreditam, apresentam baixo ou nenhum impacto na libido, podendo, até mesmo, afetar positivamente a sexualidade. E quero destacar aqui três principais benefícios que desempenham um papel importante na vida sexual e foram observados em alguns desses estudos¹, ²:
Benefícios do DIU hormonal na vida sexual
O primeiro benefício é a redução da preocupação com uma possível gravidez não planejada. Estima-se que 62% das gestações, no Brasil, não sejam planejadas, conforme revelou uma pesquisa³ da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) em parceria com a Bayer, realizada pelo Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria).
Um índice tão alarmante quanto esse reforça que é natural ter esse receio. O problema é que isso, muitas vezes, compromete a qualidade da experiência sexual. A confiança na alta eficácia do método contraceptivo permite que as pessoas desfrutem de sua vida sexual com maior relaxamento e menos ansiedade, podendo levar a um aumento na libido e na qualidade das relações sexuais.
Outro benefício é a manutenção dos ciclos ovulatórios, que amplifica a autopercepção dos fenômenos cíclicos e o interesse na atividade sexual que, classicamente, aumenta no período periovulatório (costuma ser dois dias antes e dois dias depois da ovulação, que ocorre no 14º dia do ciclo menstrual).
O terceiro efeito positivo observado é a resolução em algumas queixas ginecológicas. Para muitas pessoas, sintomas menstruais, como sangramento intenso e dismenorreia podem interferir na sexualidade. O DIU hormonal é conhecido por reduzir significativamente esses sintomas, diminuindo desconfortos físicos que acabam por afetar a vida sexual.
DIU hormonal alivia sintomas menstruais
No caso de homens trans, pessoas transmasculinas e não-binárias com útero, o uso de contraceptivos hormonais também pode ajudar na redução do sofrimento associado ao ciclo menstrual. Ao diminuir ou eliminar a menstruação – efeito proporcionado por alguns tipos de dispositivos intrauterinos -, o método contraceptivo pode proporcionar um alívio significativo da disforia, contribuindo para um maior conforto e bem-estar emocional, o que, por sua vez, oferece mais liberdade para a pessoa vivenciar sua sexualidade.
Para além dos benefícios previamente mencionados, destaco, por fim, que o uso de contraceptivos hormonais como o DIU promove uma maior autonomia e controle sobre a própria fertilidade. E, de acordo com a pesquisa do Ipec3, 94% das mulheres entrevistadas concordam que métodos de longa duração trazem mais liberdade. Este é um componente crucial para que todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero, tenham maior autonomia sobre seus corpos e suas vidas, o que é fundamental para uma vivência sexual saudável e plena.
* Dr. Edson Ferreira é ginecologista e obstetra, membro da Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
REFERÊNCIAS:
¹ Both S, Lew-Starowicz M, Luria M, Sartorius G, Maseroli E, Tripodi F, Lowenstein L, Nappi RE, Corona G, Reisman Y, Vignozzi L. Hormonal Contraception and Female Sexuality: Position Statements from the European Society of Sexual Medicine (ESSM). J Sex Med. 2019;16(11):1681-1695.
² Skrzypulec V, Drosdzol A. Evaluation of quality of life and sexual functioning of women using levonorgestrel-releasing intrauterine contraceptive system–Mirena. Coll Antropol. 2008;32(4):1059-68.
3 https://www.bayer.com.br/pt/blog/gravidez-nao-planejada-atinge-62-mulheres-brasil