Inflação no Brasil: quando os preços dos alimentos vão abaixar?
Encarecimento dos alimentos está ligado a inúmeros fatores como a pandemia, a alta do dólar e a diminuição na demanda e oferta mundial de commodities
O preço dos alimentos é uma grande preocupação dos brasileiros desde o início da pandemia. Quando pensamos nos últimos meses, é praticamente impossível não se alarmar com o custo de commodities como arroz, feijão e até mesmo o café. Isso sem falar na carne bovina, que vem encarecendo em uma velocidade surpreendente.
Inúmeros fatores podem explicar esta terrível alta nos valores da indústria alimentícia. Para compreender todos eles — e tentar estimar quando o encarecimento dos alimentos poderá dar uma freada —, Claudia entrevistou Lana Oliveira, economista, assessora de investimentos e especialista em renda variável da Acqua Vero Investimentos. Confira:
Por que os alimentos continuam tão caros?
Antes de tentarmos prever quando os alimentos poderão ficar mais baratos, é necessário entender como chegamos a este ponto. E, segundo a economista, a alta generalizada dos preços possui tanto raízes internas quanto externas. “As commodities essenciais para a produção dos alimentos estão sofrendo um processo de inflação que está ligada ao comércio internacional”, afirma.
Vale lembrar que commodities são produtos básicos com pouco ou nenhum valor agregado. “Podemos dar este nome quando não existe uma industrialização. Se plantou e colheu, é uma commodity. Esta classe de produtos não carrega grande diversificação entre os produtores. A soja plantada no Brasil é praticamente a mesma da cultivada na Rússia ou Ucrânia. Não há muito poder de mercado nem precificação”, esclarece Lana.
Portanto, para contornar esta característica “ordinária”, a especialista esclarece que foi imprescindível definir uma moeda de troca padrão que facilitasse o comércio. Por ser uma moeda forte e comum, o dólar foi o escolhido. Já começou a ter uma ideia das origens do encarecimento, né?
Definitivamente, a alta do dólar impacta negativamente as prateleiras dos brasileiros. Contudo, há outras forças influenciando o atual cenário econômico:
Guerra entre Ucrânia e Rússia
“Este é um dos fatores mais importantes, porque a Ucrânia é considerada como o ‘celeiro do mundo’. É um país muito importante para a produção de commodities agrícolas. Este contexto de guerra prejudicou tanto a produção quanto a exportação, já que a Rússia os submeteu a uma série de embargos que dificultam o comércio com outros países”, clarifica Lana. Com isso, os preços dos alimentos nos mercados disparam.
Redução da oferta
Para piorar, estamos atravessando um momento de alta inflação global. Consequentemente, os bancos centrais entraram aumentando os juros, o que diminui a atividade econômica das grandes massas. “Estamos diante de um possível cenário de recessão tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, que são grandes importadores de commodities. Essa redução na demanda até poderia diminuir os preços, já que existem menos pessoas comprando. Contudo, existe um aspecto sazonal que fez os estadunidenses produzirem menos commodities [como a soja] que o esperado. Esse aperto na oferta também aumenta os preços dos produtos”, diz a especialista em renda variável da Acqua Vero Investimentos.
Vale lembrar que, no ano passado, o dólar chegou a atingir um pico de R$ 5,50, o que definitivamente não favoreceu os nossos bolsos.
Pandemia e o preço da carne bovina
A economista relembra que a precificação da carne bovina depende muito da importação e demanda da China. “Agora, estamos vivendo um aumento da demanda desta commodity e uma redução da oferta. Isso afeta os valores. Também não podemos esquecer que, durante a pandemia, tivemos dificuldade de escoamento de produção por conta da necessidade de uma vigilância sanitária muito mais profunda. Com isso, a comercialização dos produtos entre países ficou muito mais dificultada e cara”, pontua.
O aumento no preço do petróleo também encareceu o transporte das commodities entre os países, provocando aquele efeito tenebroso nos preços dos produtos dentro dos supermercados. Quanta coisa, eim?
E aí… Quando esse terror vai acabar?
Lana afirma que há uma perspectiva de que melhorias estão por vir, contudo, ter um panorama de quando as coisas vão voltar ao normal é um pouco complexo. Entretanto, ela afirma que o governo tem tomado algumas medidas que podem ajudar bastante na redução de preços: “Foi aprovada a redução da tributação em cima dos combustíveis e da energia elétrica. O que isso tem a ver com os alimentos? Como a indústria alimentícia depende muito do transporte, essa aliviada na tributação impacta positivamente na precificação, diminuindo a inflação dos produtos.”
Outra “boa notícia” é que estamos chegando a uma taxa terminal de juros — período em que o nível de juros fica tão alto que a inflação começa a retroceder. Para a especialista, isso definitivamente poderá deixar as coisas mais baratas.
E por fim, alguns possíveis desfechos da guerra entre Rússia e Ucrânia — como a possibilidade dos russos permitirem o fluxo de exportações agrícolas da Ucrânia para outros países — podem ser úteis neste cenário de pressão inflacionária global.
Eleições terão papel importante neste assunto
Todo ano de eleição é conhecido por ser um período extremamente volátil para a economia como um todo. “Algo que pode acontecer pouco tempo antes do período eleitoral é o governo realizar maiores gastos para fornecer bens de distribuição de renda ou investir em infraestrutura. Tudo isso é ótimo, mas acaba elevando os gastos no ano de eleição”, alerta Lana.
Tais gastos aumentam o risco fiscal no Brasil — que historicamente já possui um risco fiscal bem elevado. A assessora de investimentos esclarece que a intensificação dos riscos influencia o câmbio, desvalorizando a moeda em comparação ao dólar. Com isso, as commodities ficam caras e o preço dos alimentos vai às alturas. “Não é uma regra que uma coisa necessariamente influenciará a outra, mas é uma possibilidade bem forte que vale a pena ficar de olho.”
2023 deve trazer a tão sonhada redução nos preços
O futuro é imprevisível: a economista relembra que o crescimento econômico exponencial da China, a intensificação da monkeypox e o cenário recessivo da Europa são pontos que podem nos prejudicar bastante nos próximos meses.
Contudo, ela revela que a expectativa — segundo projeções do BTG e de outros analistas de mercado — é que ocorra uma freada na recessão a partir do ano que vem. “Só não sabemos a intensidade e em que momento (se será no primeiro ou segundo semestre). Mas a expectativa é de que as coisas gradativamente melhorem de 2023 para frente”, conclui.