A ministra que está contendo a Covid-19 em um dos países mais populosos
No estado de Kerala, que apresentou os primeiros casos de Covid-19 na Índia, K.K. Shailaja agiu rápido para evitar a disseminação do novo coronavírus
Quando o governo federal da Índia fechou escolas e comércio em 25 de março, foi iniciada a maior quarentena do mundo contra a Covid-19, com 1,3 bilhão de pessoas orientadas a sair de casa apenas para ações indispensáveis. Além de ser o segundo país mais populoso do mundo, a Índia é também tem alta densidade populacional – são em média mais de 300 pessoas por quilômetro quadrado –, o que torna o controle à disseminação do coronavírus causador da Covid-19 um desafio ainda maior. Mas Kerala, um estado de 34 milhões de habitantes no sudoeste do país, tem contrariado os prognósticos ao obter sucesso razoável no combate ao vírus a partir de ações imediatas tomadas pela ministra da Saúde e Justiça Social da região, a ex-professora de ensino médio K.K. Shailaja.
As primeiras infecções em Kerala foram importadas de Wuhan, com o retorno de estudantes de medicina indianos que estudavam na cidade chinesa onde a pandemia começou – um deles contou à revista local The Week que a ministra da saúde chegou a visitá-lo na enfermaria em que estava internado. Assim que houve essas confirmações, K.K. Shailaja determinou que os aeroportos internacionais do estado fizessem rígido monitoramento da saúde dos passageiros. Quem apresentasse sintomas poderia ser testado ou monitorado; desde então, os todos que chegam de avião ao estado precisam passar 28 dias em isolamento, período maior do que o recomendado pela maioria dos países. Antes mesmo da quarentena nacional, aulas foram suspensas, aglomerações proibidas e até locais de culto deveriam ser evitados pelos indianos de Kerala.
A Índia tem, até esta quinta-feira (23), 21,8 mil infectados pelo novo coronavírus e 686 mortes, de acordo com levantamento da Universidade John Hopkins. O primeiro caso se deu em Kerala ainda em janeiro, mas o estado conta agora com três mortes e 427 infectados. Entretanto, os dados indicam que Kerala está caminhando para “achatar a curva”, isto é, reduzir a incidência de novos casos e evitar o estresse do seu sistema de saúde – o que já acontece em outras regiões do país, incluindo a capital Mumbai.
“Lutar com uma pandemia requer rigor científico, humanidade e um espírito propenso a investigações e mudanças. Superstições, ignorância, sentimentalismo e irracionalidade vão desconcertar todo o processo ao desanimar e desencorajar os especialistas em saúde que estão dando duro para resolver o problema com ciência. Em Kerala, nós iniciamos políticas rigorosas contra quem tentar espalhar estupidez que foram algumas das razões para termos tido algumas vantagens iniciais em controlar a disseminação do vírus”, disse a ministra ao site HuffPost Índia no início de abril.
Para garantir que as famílias conseguiriam permanecer em casa, o governo passou a enviar mantimentos diretamente a elas, manteve a merenda escolar mesmo com as escolas fechadas e estabeleceu linhas telefônicas para prestar atendimento psicológico à população. Ao mesmo tempo, pessoas com sintomas suspeitos ou que tiveram contato com algum paciente foram rastreados com atenção logo nas primeiras semanas. Diferentemente de outros locais que obtiveram sucesso em conter o coronavírus, como a Coréia do Sul, em que houve testagem em massa, Kerala se valeu sobretudo da colaboração da comunidade em seguir as regras.
Nesse sentido, contribui o fato de o estado ter, recentemente, enfrentado uma epidemia do vírus Nipah que matou 18 pessoas de maio a junho de 2018. Assim como o coronavírus causador da Covid-19, o Nipah se originou de morcegos e, transmitido entre humanos, causa síndrome respiratória aguda grave. Na época, Kerala precisou criar protocolos de atendimento e percebeu o valor do isolamento e rastreamento de infectados, comunicado de forma trasparente ¡a população.
Além disso, o estado tem um sistema de saúde mais estruturado do que no restante da Índia, resultado de investimentos perenes na área. Ele foi um dos primeiros a contar com um sistema único de saúde – países como Reino Unido e o Brasil também contam com a estrutura – e os equipamentos são descentralizados, colaborando para mais eficiência nos atendimentos. Kerala também tem políticas de saúde mundialmente elogiadas por sua efetividade, como a de incentivo ao aleitamento materno reconhecida pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), é um dos estados com menor nível de mortalidade infantil da Índia.
Apesar dos bons resultados para controlar o coronavírus, a falta de testes em Kerala – o governo enfrenta atrasos na entrega desses insumos, que estão escassos no mercado – pode retardar o combate ao vírus caso uma nova escalada de casos acometa a região. Preocupa também o fato de a população local ter altas taxas de algumas comorbidades, principalmente diabetes.
“A guerra contra o coronavírus em Kerala não acabou. Nós fomos capazes de conter a ameaça, mas não estamos em posição de dizer que estamos completamente seguros. Estamos mantendo estrita vigilância em aeroportos, hotéis e centros turísticos. Estudantes voltando para casa do exterior estão sendo examinados”, afirmou ela sobre as medidas para manter os avanços.