A arte de ser infeliz
Ser triste não é uma mera questão de escolha, mas que às vezes a pessoa não se ajuda, ah, isso é verdade! Leia a nova coluna da nossa editora Liliane Prata
Mexendo na estante de uma amiga minha (adoro bisbilhotar a estante alheia!), encontrei um livrinho com um título sugestivo: A Arte de Ser Infeliz. O autor, Paul Watzlawick, se propõe a fazer uma abordagem psicológica daqueles que, adivinha, parecem ter um talento especial para a infelicidade.
Claro que alguém mais crítico, consciente ou simplesmente mal-humorado pode alegar que ser triste, assim como ser alegre, não é apenas uma questão de escolha. Que há muitos fatores envolvidos, que o ser humano é uma coisa complexa, que “é fácil falar”. Concordo. Mas as páginas que folheei pareciam se direcionar àquele tipo específico de pessoa que, genética e problemas como depressão à parte, fazem questão de dificultar algo que, por natureza, já não é lá muito fácil – a vida. E todo mundo conhece pessoas assim.
Para mim, pessoas que dominam a arte de ser infeliz são aquelas que, por algum motivo, têm o hábito de se sabotar. Relações, novidades, mudanças: elas são as primeiras a fazer de tudo para que o negócio não flua, não seja tranquilo, não dê certo.
Penso em quem exige tanto de si mesmo que nem se arrisca a tentar algo diferente, com medo de não corresponder às (altíssimas) expectativas que criou. No fulano que faz questão de apontar os erros, fraquezas e dificuldades dos outros e de si mesmo. Na fulana que não está nem um pouco preocupada em desenvolver autocontrole: sabe que perseguir o ex ou brigar com a mãe vai fazer mal a ela, mas persegue e briga de novo, e de novo e de novo. No ciclano que tem certeza de que sabe tudo e já aprendeu o que tinha de aprender. Em quem reclama das mesmas coisas há um, cinco, dez anos, mas ignora as sugestões de todos à sua volta e prefere continuar se lamentando em vez de fazer alguma coisa. Naquele que não faz o menor esforço para repensar os próprios padrões e preconceitos. Que já entra em um relacionamento achando que vai dar errado, testa a paciência do outro e, no relacionamento seguinte, faz tudo igualzinho.
Uma vez li que pessoas assim, que testam os limites dos amigos e da família, agem assim por carência e falta de amor próprio. É como se dissessem: “Olha só, para ter certeza de que você gosta de mim, vou fazer de tudo para ser insuportável e ver se você continua por perto. Só assim me sentirei amado”. Faz sentido. E, bem, às vezes os outros continuam por perto, mesmo, seja por esperança que o infeliz/amargurado mude, seja por sensação de dever. Mas, às vezes, os outros desistem. E quem é capaz de julgá-los?
Sabe como é, os que dominam a arte de ser infeliz também dominam a arte de repelir o próximo. E o amor que o próximo sente nem sempre acaba, mas, às vezes, um amor à distância pode ser mais indicado para quando a paciência, essa sim, vai embora.