“Tenho 37 anos. Aos 8, fui abusada por um vizinho. Meus pais eram muito amigos desse casal de idosos que morava ao nosso lado e tinham dois filhos jovens. Eu e minhas irmãs assistíamos TV lá, mas sempre com a presença da minha mãe. O filho do casal tinha algum problema mental não diagnosticado. Hoje, acredito que era esquizofrenia. Ele não trabalhava por causa disso, mas parecia levar uma vida normal.
Meu pai era pedreiro e muitas vezes resolvi pequenos problemas nas casas dos vizinhos. Uma dessas vezes, eu fui com meu pai. A casa era enorme. Enquanto meu pai consertava algo no banheiro, fiquei sozinha com o filho do casal. Foi quando ele me levou para um banheiro e começou a se masturbar na minha frente.
Ele me pedia par pegar no pênis dele, forçava a minha mão. Eu fiquei petrificada, com nojo, vergonha. Mas não tive reação para sair daquilo. Não sei quanto tempo demorou, mas pareceu uma eternidade. O abuso acabou quando minha mãe começou a gritar meu nome lá de casa.
Outra dia, eu e minhas irmãs estávamos sozinhas em casa. E ele queria entrar de qualquer modo. Quando minha irmã foi abrir a porta, eu gritei o nome da outra vizinha, que estava sendo nossa babá. Não contei nada disso para ninguém naquela época.
Minha mãe queria continuar frequentando a casa deles e eu não queria. E não podia ficar sozinha. Foi quando falei a verdade. Só que eu era inocente, não compreendia o que tinha acontecido, não sabia o nome, apenas que era errado.
Não sei se meus pais acreditaram e se falaram alguma coisa para o casal de idosos, mas o relacionamento com os vizinhos mudou um pouco, não íamos mais à casa deles. Minha mãe me culpou por ter ido sem sua permissão e presença – e mais ainda por não ter ido embora na hora. A mulher do casal ainda ia lá em casa.
Meu corpo mudou muito depois dessa época, os seios cresceram rapidamente. Menstruei aos 9 anos, acho que por causa desse drama todo. Nos mudamos de estado depois de três anos.
Esse acontecimento criou uma falha no meu relacionamento com minha mãe. Eu a culpei inconscientemente por ter mantido uma relação com aquela família. Ela não fez nada, nunca mais confiei 100% na minha mãe.
Depois de 21 anos, minha mãe e eu voltamos para visitar a antiga casa em que morávamos e a mãe do meu abusador nos convidou para um café. Quando entrei na casa, me senti com 8 anos novamente. Entrei no piloto automático, comecei a passar mal. Ele estava em casa, mas não saiu do quarto.
Infelizmente, não pude confrontá-lo. Também não pude conversar sobre o assunto com a minha mãe. Assim que retornamos dessa viagem, ela morreu.
No ano passado, ouvi minhas irmãs conversando sobre mim. Minha irmã mais nova estava namorando e eu não conseguia ficar perto do namorado dela. Elas concluíram que eu tinha algum problema com o sexo oposto.
Eu sou virgem e nunca namorei. Acredito que seja por causa do abuso. Não suporto abraços masculinos. Nem me sentar perto de um homem eu consigo. É por isso que nunca namorei. Antes, me convenceram que era porque eu não tinha gostado de ninguém, mas o trauma é real. Não consegui passar da primeira aula de defesa pessoal porque o professor era um homem.
Nunca tratei isso, mas se senti motivada lendo os relatos aqui de pessoas que conseguiram melhorar com ajuda. Leitoras, minha mãe tinha muito cuidado conosco, mas sofri isso apesar de sua vigilância. Os abusadores, segundo pesquisas, normalmente são bem próximos. Eles escondem o perigo construindo relações, aí não conseguimos imaginar que momentos tão dolorosos podem acontecer.”
A partir de agora, CLAUDIA mantém esse canal aberto e oferece acolhimento para quem quiser libertar as palavras e as dores que elas carregam. Fale com CLAUDIA em falecomclaudia@abril.com.br.
*Nome trocado a pedido da personagem