“O Brasil gosta de silenciar a própria história”, declara Bianca Santana em novo livro
Em sua estréia como romancista, Bianca Santana traz as vivências da migração de duas mulheres nordestinas
A escritora Bianca Santana lança seu primeiro romance, Apolinária (Fósforo, 2025). Nele, conta a história de uma nordestina que migra para a capital paulista. No livro, a autora intercala com sensibilidade as vozes de Polu, a avó, e de Bianca, a neta. Com temas como trabalho doméstico e casa própria, Apolinária é um retrato da sociedade brasileira.
São duas narradoras no livro. Como foi assumir tanto a voz da avó como da neta? Eu tinha esse desejo de experimentar vozes diferentes e de me testar como escritora, de desenvolver duas narradoras em primeira pessoa. Será que consigo, na própria voz narrativa, colocar a característica de duas personagens tão diferentes? Foi um desafio para mim mesma.
O tema do trabalho doméstico das mulheres negras atravessa a trama. Por que ainda persiste? O Brasil gosta de silenciar a própria história. A Lélia González, lá nos anos 70, já explicou que, na abolição, não existiu nenhuma política de reparação para a população negra no Brasil. Então, as famílias negras não tinham muita condição de se inserir naquele capitalismo que nascia num novo formato com trabalho livre. A única possibilidade de renda para maior parte das famílias era o dinheiro que as mulheres traziam para casa, não os homens. Elas faziam isso porque conseguiam trabalhar como empregadas domésticas.
A conquista da moradia própria também é um tema do livro. O que a casa própria representa? A falta de moradia produz desenraizamento. Aluguel é um terror para famílias pobres. O sonho da casa própria é também um sonho de poder empregar o seu dinheiro em mais coisas que não só a sua possibilidade de existir com teto sobre você. Parar de pagar aluguel significa se alimentar melhor, ter algum lazer, mais tempo de descanso, poder arrumar sua casa do seu jeito e não viver com o temor de que você vai ser desalojada, desapropriada e ter que, de novo, se mudar.
A avó arruma o cabelo da neta com medo de que pareça “ruim”, como diz o livro. Sua experiência pessoal ajudou a desenvolver esta cena? Totalmente. A personagem é muito inspirada na minha avó Apolinária. É uma mulher do tempo dela, que embarcou numa ideia de embranquecimento como sinal de melhora. Essa cena foi inspirada em inúmeras cenas que eu vivi com a minha vó. Ela puxava bem meu cabelo, passava uma tonelada de creme e prendia muito para trás, para não ter um fiozinho solto, sabe?
O irmão da personagem é preso, mas ela já sentia muito medo de que isso acontecesse com o pai. A literatura ajuda a entender o racismo estrutural? A população carcerária no Brasil é tão negra que dificilmente você vai conhecer uma pessoa negra que não tenha um parente preso. A pessoa que tem um parente preso, ela não quer que ninguém no trabalho dela saiba disso. E você tem um grande silêncio. A literatura me parece ter essa importância também de trazer à tona os temas sobre os quais a gente não quer falar.
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