“Essa vai ser uma novela sem vergonha”, afirma a diretora de Beleza Fatal
Após 29 anos na TV Globo, Maria de Médicis dirige a primeira novela da Max
Maria de Médicis iniciou sua carreira no teatro nos anos 1980. Apesar de trabalhar como atriz, sua vocação para os bastidores prevaleceu: foi produtora de elenco, produtora de set e assistente de direção antes de ser promovida a diretora.
Sua estreia aconteceu em Estrela-Guia, de 2001, na TV Globo. Desde então, esteve à frente de diversas narrativas bem conhecidas pelo público, como Segundo Sol, Babilônia, Geração Brasil, Cheias de Charme, Tititi, entre outras.
Com mais de 30 anos de carreira – 29 deles na Globo –, a profissional pode dizer que é especialista em melodrama. Ela sabe o que faz um capítulo se destacar, como conduzir uma cena da melhor forma e está atenta à resposta do público. Agora, ela acaba de realizar um novo desafio: a direção geral da primeira novela da Max.
Maria de Médicis está no comando da primeira novela da Max
Nomeada Beleza Fatal, a trama conta com roteiro do escritor Raphael Montes e um elenco marcado por nomes como Camila Pitanga, Giovanna Antonelli e Camila Queiroz.
Segundo Maria, a obra é cheia de reviravoltas, tensões e ousadia. A história de 40 capítulos tem como pano de fundo o agitado mundo da beleza e dos tratamentos estéticos.
O foco vai na busca por justiça de Sofia (Camila Queiroz), que vê a mãe ser presa injustamente por causa de sua tia Lola (Camila Pitanga).
Enquanto Lola se torna dona de um império de beleza, Sofia é acolhida pela família Paixão, especialmente pela matriarca Elvira (Giovanna Antonelli), que sofre pela condição da filha Rebeca, internada em estado grave após uma cirurgia plástica malsucedida na clínica de Lola.
Neste cenário, Sofia e Elvira se unem na dor e indignação contra Lola e os culpados por suas tragédias pessoais. A estreia está marcada para o dia 27 de janeiro.
Abaixo, confira a entrevista completa:
CLAUDIA: Qual é a principal característica da novela brasileira?
Maria de Médicis: A novela é feita com melodrama, que é sua principal característica. Mas o que faz com que ela se destaque é a essência brasileira. É uma narrativa que fala do Brasil, tanto do cara da classe média, da classe baixa, do rico… Você se reconhece ou sente que pode chegar ali onde os personagens estão. É possível se ver naquela história. É isso que faz alguém comprar no camelô aquela joia que a Giovanna Antonelli usa, por exemplo.
O reconhecimento traz a sensação de conforto e pertencimento ao espectador. Além disso, ainda há uma certa ousadia nas histórias. Por que eu falo ousadia? Nos anos de ditadura e censura, havia um jornalismo alinhado com a ditadura mas, ao mesmo tempo, histórias totalmente progressistas na dramaturgia: foi naquela época surgiram os primeiros casais homossexuais e as famílias negras de posse na televisão.
CLAUDIA: O que faz algumas novelas serem icônicas e atravessarem o tempo?
Maria de Médicis: Primeiro de tudo, uma grande história. Eu revi Vale Tudo inteira no mês passado. Essa é uma aula de novela. Ela traz conforto, tem ousadia e ainda conta com mudanças e reviravoltas o tempo inteiro. Uma boa trama precisa de um gancho forte e longo, de um gancho diário e, ainda, um gancho semanal – para o público assistir no sábado e querer continuar na segunda-feira.
CLAUDIA: Estamos vivendo a era dos remakes. Como você percebe esse momento?
Maria de Médicis: Não sou contra os remakes. Eu assisti Pantanal e Renascer pela nostalgia que eles trazem. Sinto que estamos vendo esse momento no mundo todo – não só na televisão, mas na moda, na música e também em outros setores. Ao mesmo tempo, vivemos uma crise criativa. E, talvez, temos menos ousadia e menos vontade de apostar em novos talentos.
Quando a Max dá a primeira novela para o Raphael Montes, que nunca havia realizado algo assim antes, faz uma aposta ousada. Falta isso na TV aberta, ainda que seja algo mais difícil de ser feito. Se alguém erra no streaming, vai ter outra oportunidade. Errar na Globo é diferente.
CLAUDIA: Quais são os desafios e as diferenças de fazer uma novela na TV aberta e no streaming?
Maria de Médicis: A essência do set de filmagem é a mesma. A grande diferença entre novela de TV aberta e streaming é que você tem uma obra aberta contra uma obra fechada. E acho que tem vantagens nas duas. A TV aberta conversa com o público. Você tem a resposta do dia a dia e, muitas vezes, ela pode mudar a novela inteira. É o caso do Félix, em Amor à Vida. Ele jogou o bebê da irmã na caçamba do lixo e o público o perdoou. A novela, inclusive, acaba com um beijo na boca dele com o par romântico. Já em uma novela de streaming, com 40 episódios, tudo é gravado antes de ir ao ar.
CLAUDIA: O que podemos esperar de Beleza Fatal?
Maria de Médicis: Digo que ela é uma novela com botox, tem um tonzinho e uma ousadia a mais. É despudorada. Não tem vergonha. É um melodrama com vilã, com mocinha e com personagens que vão se transformar muito, que não vão ser o que a gente pensa quando começa a história. Essa vai ser uma novela sem vergonha.
Quando começou a ter muita influência das séries na TV, passamos a querer fazer também capítulos com cara de série – com uma fotografia mais rebuscada e histórias diferentes. E aí acho que a gente se afastou do melodrama. Beleza Fatal volta para a origem e para a essência da novela.
CLAUDIA: Com o avanço das redes, está mais difícil se conectar a um filme sem pegar o celular. Você acha que a internet mudou a forma como consumimos a novela?
Maria de Médicis: Em Vale Tudo, há cenas que duram quatro, cinco, seis minutos. É possível ver a construção do conflito e o ambiente se transformando. Hoje, as cenas começam no meio, já na porrada. Tudo precisa ser mais curto, literalmente, mais dinâmico. Você precisa chamar mais a atenção, tem que ser mais barulhento. A casa já não se reúne para assistir a novela como antes acontecia. Fica cada um no seu mundinho e os produtores precisam saber captar a atenção do público.
CLAUDIA: A novela no streaming vai ser uma tendência?
Maria de Médicis: Acredito que sim. O mercado brasileiro e latino-americano têm uma demanda grande por esse tipo de produto. E não acho que é o fim da TV aberta porque vivemos em um país onde nem todos acessam a internet ou podem pagar serviços de streaming. Além disso, as telenovelas são realizadas com os melhores atores e diretores brasileiros – o que é um ponto muito positivo. Elas não vão perder seu valor.
CLAUDIA: Qual é a maior realização de Beleza Fatal?
Maria de Médicis: É conseguir fazer, pela primeira vez, uma novela de qualidade em um novo lugar. Sinto que fizemos uma produção grandiosa, maravilhosa e que arrebenta! E conseguir fazer isso fora de uma estrutura que faz isso há 60 anos é muito gratificante.
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