Café Por Elas: conheça a marca que insere mulheres no circuito cafeeiro
As irmãs Nadia e Julia Nasr concretizaram o desejo de honrar a história das mulheres da família e adicionar novas figuras femininas a esse espaço
A primeira memória que Nadia Nasr tem do café vem da infância. Mas não se engane: a lembrança não é nem um pouco romântica. Quando ela e a irmã, Julia, ainda eram crianças, sua mãe, Abadia, adquiriu o terreno de uma fazenda em Dourado (SP), e lá passou a produzir café.
Aos finais de semana, quando as meninas iam para o interior com a família para relaxar, a volta era num carro forrado de grãos. “Eu falava para minha mãe abrir o vidro, odiava aquele cheiro forte”, conta, sem cerimônia.
Além de detestar o aroma, Nadia também repudiava o gosto da bebida. Achava amarga e ficava se perguntando como as pessoas podiam dizer gostar desse sabor. Corta para hoje, em 2024, num cenário onde ela não só é especialista em café, como administra, junto à irmã, uma empresa totalmente dedicada à bebida: o Café Por Elas.
O que mudou de lá para cá foi a descoberta da delicadeza dos grãos de qualidade. “Uma amiga me trouxe um café de uma viagem, e aquele pacote ficou no armário. Até que um dia decidi provar e estranhei muito. Subiu um aroma tão gostoso, que aquilo me marcou. Contei para minha mãe e ela disse: ‘Sim, filha, isso é um café especial’”, relembra.
O nome Café por Elas veio da admiração das irmãs pela mãe e pelas mulheres da família, que abriram o caminho para que elas pudessem hoje desenvolver o trabalho com tanta vontade. Neta e bisneta de agricultores, Abadia Helena Gomes da Silva, a matriarca, sempre teve o sonho de trabalhar com a cafeicultura.
Anos atrás, decidiu resgatar suas raízes e empreender na agricultura cafeeira. Dessa forma, a fazenda no interior do estado acabou se tornando um espaço de plantio e colheita.
“Sabemos que o ciclo do café tem uma história marcada por explorações e abusos – de mão de obra e do meio ambiente. Minha mãe trouxe um olhar novo e consciente”
Nadia Nasr
“Ela foi muito desestimulada pelos homens ao redor. Isso me marcou profundamente, porque acho que ela se viu muito sozinha. Estava cercada por homens dizendo que não iria dar certo, que ela estava louca. Mas foi muito visionária e passou a contratar mulheres para a fazenda”, explica Nadia.
A empresária explica que, na fazenda, as mulheres ocupam espaços não só na colheita manual — função mais comum —, mas também dirigindo tratores, na mecânica, na torrefação e na administração. “Sabemos que o ciclo do café não veio de uma cadeia honesta, é uma história marcada por explorações e abusos — de mão de obra e do meio ambiente. Minha mãe trouxe um olhar novo e consciente”, relata Nadia.
Enquanto as irmãs atuavam na advocacia, a vontade de abrir um negócio começou a surgir em ambas. Em 2018, decidiram que o destino daquela família era mesmo o café, não tinha como negar. “A vontade era homenagear o pequeno universo dessas mulheres que me inspiraram intimamente”, conta Nadia. Pouco tempo depois, o negócio se expandiu tanto que as duas abandonaram seus empregos para se dedicar exclusivamente à marca.
Quando começaram, o mercado dos cafés já estava repleto de grandes profissionais mulheres da área, que inspiraram as duas e foram fonte de conhecimento e inspiração. “Tinha a Isabela Raposeiras, a Gelma Franco, a Silvia Magalhães… Muitas mulheres fazendo trabalhos incríveis. E eu achei que não me depararia com um cenário machista, mas foi o que aconteceu. A gente engoliu muito sapo, fornecedores que falavam que éramos ‘duas garotas aventureiras’. Nos perguntavam se sabíamos quanto café teríamos que vender, coisas desse tipo…”
Hoje, o Café Por Elas faz a torra do grão produzido pela própria mãe e de mais de vinte produtoras mulheres de diferentes regiões. Os lotes são encontrados em restaurantes de São Paulo, empresas, empórios, na loja virtual e, muito em breve, num espaço físico no bairro paulistano da Santa Cecília.
Todos os grãos são categorizados como especiais, ou seja, seguem os requisitos estabelecidos pela SCA (Specialty Coffee Association) e possuem 80 pontos ou mais. O resultado são cafés com notas complexas, como frutas vermelhas e caramelo, ressaltadas pela torra clara. O público que esteve na Casa Clã 2024, em março, pode provar e saiu encantado!
“Agora, toda vez que minha mãe entra no meu carro, ela fala: ‘O mundo dá voltas, né, filha?’ Porque meu carro agora está sempre com café!”, conclui Nadia rindo, com brilho no olhar.