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Congelamento de óvulos: a nova tática de controle sob as mulheres

Estamos em 2024 e descobriram mais uma forma de disfarçadamente pressionar as mulheres

Por Martchela
16 jun 2024, 09h21
Congelamento de óvulos: uma nova forma de controlar as mulheres
Mulheres continuam sendo pressionadas em relação ao que fazer com seus corpos.  (Getty Images (Ilustração Cássia Roriz)/CLAUDIA)
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Tive três dates recentemente. Acredite se quiser, mas no primeiro deles escutei um: “E aí, você já congelou seus óvulos?”. Assim, como quem diz “bom dia”. Na hora me senti uma estranha, dei uma desculpa e desconversei. Pois no segundo date aconteceu a mesma coisa, junto de um: “Ih, tá ficando tarde, tá na hora de congelar”. No terceiro date, ao ouvir mais uma pergunta sobre meus óvulos, uma revolta me dominou: “Você sabe quanto custa? E por que você está supondo que eu quero ter filhos?”. Em seguida passei meu pix e disse: “Se quiser, bota aí o preço do congelamento, junto com o aluguel anual da preservação”.

De onde surgiu essa nova moda de caras pressuporem que temos que congelar óvulos? Óbvio que, a partir dos 35 anos, essa foi uma questão que começou a passar pela minha cabeça. Eu, que desde os 15 anos jurava de pés juntos que não queria ter filhos. Aliás, até os 34 eu jurava. Talvez ainda jure, não sei…

Mesmo assim, fui ao ginecologista. Lá se passou o seguinte diálogo: 

– Quantos anos a senhora está?

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– 36 

– Vamos congelar seus óvulos?

Respondi que não queria congelar, mas que queria ver se eu poderia ter filhos (sei lá, talvez de alguma forma eu tenha sentido o peso dos questionamentos). Fui fazer o exame. Já não sei mais o resultado, mas lembro que entrei no banheiro e chorei com medo da possibilidade de não poder ter.

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Ser mulher é complicado. Eu, que nunca quis engravidar, ali no ultrassom me imaginei ouvindo um coração de neném e chorando de felicidade. Aí logo me vem um questionamento que li na internet: você quer ser mãe? Mas quer ser mãe sozinha? Porque veja bem, a taxa de pais que abandonam as mães na gravidez ou com bebês recém-nascidos é enorme.

No Brasil, segundo o IBGE, 11,6 milhões de famílias são chefiadas por mulheres sem cônjuges. Além disso, uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo revelou que cerca de 5,5 milhões de mães solo não recebem qualquer tipo de suporte financeiro dos pais dos seus filhos.

Então me questionei mais uma vez. E mais uma. Há uma pressão social e cultural imposta para a maternidade. Será que se não fosse essa pressão eu estaria enlouquecendo e chorando no banheiro pós-ultrassom, procurando no celular quantos folículos uma mulher da minha idade precisa ter para ser saudável?

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O corpo da mulher tem que parar de ser controlado pela sociedade, pelos médicos e, claro, pela política e religião. O presidente da Coreia do Sul, por exemplo, quer criar um ministério para aumentar a taxa de natalidade. O governo investiu bilhões de dólares para incentivar os casais a terem mais filhos, mas em 2023 o país registrou apenas 230.000 nascimentos, o menor número desde o início da série histórica.

E por quê? Porque lá existe uma linha de frente de mulheres que se tocaram que ter um filho não é brincadeira. E sim, você pode ter o melhor marido do mundo, mas se seu filho tiver febre, vão ligar para a mãe. O filho caiu? Ligue para a mãe. A mulher vira o ponto central. Procriar precisa ser uma escolha individual.

Mas voltando à questão do congelamento: não é uma solução mágica. Pelo contrário: é um processo intrusivo e muitas vezes emocionalmente desgastante. Afinal, o que dizer do impacto dos hormônios no nosso corpo e mente? Além disso, há o aspecto financeiro. Congelar óvulos não é barato.

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Manter esses óvulos congelados também tem um custo contínuo. Isso sem falar na incerteza: mesmo com eles em mãos, não há garantia de sucesso na fertilização. Então, ficar repetindo que é preciso congelar óvulos, como uma espécie de seguro contra imprevistos, pode ser um fardo imenso e desnecessário.

Antigamente, a pressão era para casar e ter filhos cedo. Hoje, a pressão é para planejar meticulosamente cada passo da nossa vida reprodutiva. Em ambas as situações, a autonomia da mulher sobre seu próprio corpo e suas escolhas de vida é frequentemente posta em xeque. 

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