A demência que nos ronda
Estamos vivendo mais. Estamos vivendo melhor. Mas no meio do caminho pode acontecer a página em branco
Puxado ver tanta gente produtiva, povo que ralou duro, pessoas que nunca deixaram a peteca cair, entrarem no trem fantasma do esquecimento. Virei PHD doméstica com minha mãe se ausentando de tudo e todos, cara a cara comigo.
É como sangrar sem chances de cura. Ela só piora, e eu assisto de camarote a essa decadência dolorosa para quem está na plateia. Troca nomes, datas, mistura tudo…. Ainda me reconhece, lembra de momentos espaçados e segue firme pegando sua vida na unha.
Que vida? Por vezes, acho que ela é outra pessoa. Nunca foi dócil e agora é um poço de amor. Nem sei lidar com tanto afeto. Para mim só tem palavras carinhosas, nunca reclama, tudo está perfeito e ela está sempre com um sorriso.
Como diz minha filha, a doença dela nos presenteou com uma nova pessoinha que nunca conhecemos. Minha mãe sempre foi solar, protagonista da vida, cagadora de regra, vivia com razão. Hoje é pura emoção. Você pode pensar: que maravilha! Mas até esse excesso de amor nos fere. Louco né?
E vou aproveitando o inaproveitável, pois a decadência humana fere. Recentemente, venho vendo a questão do Bruce Willis, do Mauricio Kubrusly, da Sharon Stone que passou por um problema de saúde mental, do meu amigo de trabalho que já está no mundo da lua e eu mesma começo a me perceber esquecida. Coloco toda a culpa na menopausa, mas, cara, o problema da demência é real. Estamos vivendo mais. Estamos vivendo melhor. Mas no meio do caminho pode acontecer a página em branco. Por isso, aproveita tudo hoje. Tudo .