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Flavia Viana

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Bailarina e jornalista, ou jornalista e bailarina. Tanto faz. A coluna fala sobre métodos, histórias, entrevista pessoas, mostra tendências, espetáculos, entre outros assuntos relacionados, mas colocando em tudo isso o mais importante: seu grande amor pela dança
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A arte não pára, nem na quarentena

Em tempos de pandemia e isolamento social, um ensaio exclusivo com cinco bailarinas brasileiras com destaque em suas companhias dentro e fora do país

Por Flavia Viana
Atualizado em 2 set 2020, 12h32 - Publicado em 28 jul 2020, 09h00
 (Arte/CLAUDIA)
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O mundo vive um momento difícil e ainda incerto. Meses já se passaram e a espera pela “normalidade” se torna o maior objetivo das pessoas em todo o planeta. A Covid-19 transformou hábitos e pessoas, mas trouxe também encontros, certezas e esperança. Para o segmento da dança, adaptações e reinvenções, mas parar jamais! Inspirada nesse momento tão único em tantos sentidos, a fotógrafa Daniele Akemi registrou e dirigiu à distância, bailarinas brasileiras como Claudia Mota, Bruna Gaglianone, Ingrid Silva, Thamiris Prata e Luiza Lopes, que trouxeram para a coluna alguns de seus balés e personagens preferidos, diretamente de suas casas, afinal de contas estamos vivendo em um momento de isolamento e distanciamento social.

“Fiquei muito emocionada ao receber o convite da Flavinha para registrar este projeto bastante encantador e desafiador ao mesmo tempo. Em meio a tudo isso que estamos vivendo, poder reinventar-se é maravilhoso, o desafio me fez mover-me, mesmo sem sair de casa. Cada ensaio é uma história contada através de imagens, poder registrar o íntimo de bailarinas tão incríveis e ainda dessa forma inusitada, foi uma experiência única e inspiradora que vou guardar com muito carinho. Acredito que para uma lembrança completa, a fotografia precisa ser, além de bela, uma experiência agradável também, ver o sorriso de cada uma, foi muito especial para mim, sensação de dever cumprido, assim como nos ensaios presenciais. ” conclui Dani.

Além de Akemi, mais uma participação especial na coluna, o da publicitária e estudiosa em história da dança, Milena Pontes do blog Tutu4Love, parceira de longa data. Na matéria, ela contará um pouco sobre os balés e personagens escolhidos pelas bailarinas. “Adorei o convite para participar e estou curiosa para ver o resultado final desse trabalho tão lindo e emocionante”, finaliza.

Daniele Akime foi para o Rio de Janeiro, Nova York, depois passou por São Paulo, Suécia e Joinville, onde a bailarina que dança no Theatro Bolshoi, Bruna Gaglianone, está por causa da pandemia (senão estaria na Rússia, onde mora há oito anos). Da idéia a realização desse editorial foram quase dois meses, mas sem dúvida alguma valeu a pena registrar algo tão exclusivo e emocionante para o mundo da dança.

A Julieta de Claudia Mota

Cláudia Mota
(Daniele Akemi/Reprodução)

 

A primeira bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro Claudia Mota viveu em sua casa Julieta, do ballet “Romeu e Julieta”. “Escolhi “Julieta” por ter sido um marco na minha carreira e por ter trabalhado com Márcia Haydée e Richard Cragun para esse papel. O balé foi criado para os dois por John Cranko. Foi um privilégio para mim”, disse Claudia.

“No ensaio para a coluna me senti muito à vontade. Não parecia ser a primeira vez nessa experiência. A Dani foi muito paciente e sensível. Tudo deu certo. Estou muito feliz com o resultado”, finaliza ela.

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Cláudia Mota
(Daniele Akemi/Reprodução)

“Romeu e Julieta’, de 1940, é citado como talvez o bailado mais importante produzido na Rússia desde o sucesso de “A Bela Adormecida”.  A proposta inicial para esse ballet baseado na obra homônima mundialmente conhecida de Shakespeare, tinha um desfecho diferente do que conhecemos. Os amantes não morriam, eram reconciliados e a história terminava com grande alegria e celebração. Porém, isso não foi bem visto pelas autoridades, então Prokofiev seu compositor, eliminou o final feliz e substituiu a música por algo adequadamente fúnebre. Aliás, as músicas compostas no início foram interpretadas pelo coreógrafo como “complicadas” e dissonantes, e pela primeira bailarina a interpretar o papel de Julieta  –  Galina Ulanova como algo “não dançável”.  Porém, sua interpretação da paixão inocente de Julieta se tornou um marco em sua carreira. Apesar de remendos e muitas alterações para chegar a uma partitura mais simplificada feitas pelo coreógrafo para a tristeza do compositor, “Romeu e Julieta” estreou com grande sucesso e até hoje continua sendo produzido. Com uma coreografia altamente melodramática, é uma obra admirável por sua clareza e paixão constante. Nada de passos floreados e gestos estilizados como havia sido feito até esse ponto da história do ballet, nesse drama os passos de dança, muitas vezes acrobáticos, se misturam a interpretação dos bailarinos.

A sensualidade de Quitri na pele de Bruna Gaglianone

Bruna Gaglianone
(Daniele Akemi/Getty Images)

A bailarina brasileira Bruna Gaglianone , do Theatro Bolshoi de Moscou, viveu em sua casa Kitri, do ballet  “Don Quixote”.  “Escolhi o papel de Kitri porque foi o último personagem que dancei antes da quarentena. Foi muito especial para mim porque dancei no espetáculo de aniversário de 20 anos da Escola do Teatro Bolshoi aqui no Brasil, onde estudei e me formei. Fotografar com a querida Dani foi uma experiência incrível e diferente porque fizemos tudo à distância, mas o resultado ficou maravilhoso”, explica Bruna.

Kitri, protagonista da obra “Don Quixote”, de 1869, é uma jovem de Sevilha, graciosa, esperta e vivaz, apaixonada por Basílio. Porém, seu pai insiste que ela se case com Gamache, um nobre. É dentro desse dilema que o ballet favorito de muitos se desenrola com cores alegres e coreografias virtuosas.

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Bruna Gaglianone
(Daniele Akemi/Getty Images)

Este foi o primeiro, e é o mais famoso das grandes obras de Marius Petipa com tema espanhol. Ele já havia criado outros dentro dessa temática, mas esse foi o que melhor incorporou seu conhecimento da dança e da cultura obtido durante os três anos que morou na Espanha. Desde a sua estreia, “Don Quixote” obteve grande sucesso, porém a versão dançada atualmente foi fortemente influenciada pelo renascimento de Alexander Gorsky, em 1902, o que teria sido muito diferente da primeira apresentação criada por Petipa 33 anos antes.

Adaptado do romance de Miguel de Cervantes, a obra está presente no repertório de todas as grandes companhias clássicas. Anna Pavlova, um ícone do ballet, contribuiu  muito para a popularização da personagem após em 1924, dançar em uma breve síntese do renascimento da versão de Gorsky na Royal Opera House, em Londres.

A dualidade de “O Lago dos Cisnes” por Thamiris Prata

 

Thamiris Prata
(Daniele Akemi/Reprodução)

A bailarina Thamiris Prata, solista da São Paulo Cia de Dança, viveu em sua casa Odette /Odile  do  ballet  “O Lago dos Cisnes”. “O Lago dos Cisnes é um balé que exige muito da bailarina. Tanto tecnicamente quanto artisticamente. Viver duas personalidades na mesma noite, com emoções diferentes é desafiador e prazeroso. Eu ensaiei bastante para ter tranquilidade técnica e estudei muito para encontrar as personagens em mim. Sabrina Streiff (assistente de remontagem) me ajudou, me inspirou e me tornou um cisne. Antes de entrar em cena eu sentia uma energia forte que me acolhia. Eu lembrava das bailarinas que tinha assistido e entrava no palco grata por também viver essa história. E a música de Tchaikovsky é absurdamente perfeita”, ela diz.

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“O Lago dos Cisnes” me encanta pela grandiosidade da coreografia, pelo gestual dos cisnes, pela música, pela dramaticidade da narrativa.  Foi inesquecível dançá-lo. Nós somos muito unidos na SPCD e agradeço por ter amigos de trabalho tão inspiradores e que vibram na mesma sintonia. Me maquiei, coloquei os adereços e senti uma saudade do camarim, das horas que antecedem o espetáculo, da preparação e concentração. Adorei fazer as fotos em casa e achei muito interessante como a Dani usou a tecnologia para esse fim.  E ela me fez perceber como minha casa pode ser um cenário incrível”,  acrescenta Thamiris.

Thamiris Prata
(Daniele Akemi/Reprodução)

O papel de Odette/ Odile é uma das maiores aspirações de uma bailarina; sua dualidade exige uma composição dramática e técnica extremamente difícil. O maior desafio está em nivelar as interpretações, preservando suas personalidades tão diferentes envolvendo o público neste momento crucial da trama, o momento em que Odile aparece.

Odette é a rainha dos cisnes; frágil e espiritual, enquanto Odile é um ser criado pelo feiticeiro à imagem e semelhança de Odette, mas se apresenta sedutora e humana para confundir e seduzir o príncipe Siegfried que jurou seu amor a Odette.

“O Lago dos Cisnes”  foi umas das primeiras partituras do compositor Tchaikovsky para ballet, e como muitas outras obras, a estreia foi um fracasso. Mas depois de algumas tentativas com diferentes coreógrafos, em 1895,  “O Lago dos Cisnes” é encenado com coreografia de Marius Petipa e Lev Ivanov, em quatro atos e entra para história como um dos momentos mais sublimes e românticos do ballet, marcando também importantes evoluções técnicas e novos desafios para suas futuras intérpretes como os tradicionais trinta e dois fouettés ao final do grand pas de deux de Odile e Siegfried, realizado primeiramente por Pierina Legnani, sendo até os dias de hoje reproduzido e aprimorado compondo muitas outras histórias, e aguardado com empolgação pelo público.

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Giselle, a heroína romântica, por Luiza Lopes

Luiza Lopes
(Daniele Akemi/Reprodução)

A bailarina brasileira Luiza Lopes, primeira solista do Royal Swedish Ballet, da Suécia, viveu em sua casa Giselle do ballet “Giselle”. “Escolhi Giselle pois em minha carreira até hoje, foi um dos papéis mais marcantes e mais emocionantes que já vivi. Ela vive todos os sentimentos em cena e isso para mim é mágico e eu me identifico bastante com a intensidade que ela vive cada emoção. Fazer esse ensaio foi uma experiência nova, porém muito interessante. Estamos todos aprendendo com esse “novo mundo”, vamos ter que nos readaptar e redescobrir novas formas de expressar a arte! Foi muito bacana,” diz Luiza.

A história que teve sua estréia em 1841, se passa na Alemanha medieval e Giselle, a protagonista que dá nome ao ballet, é uma bela jovem camponesa, de espírito livre, mas que tem um destino trágico.

Luiza Lopes
(Daniele Akemi/Reprodução)

Esse é considerado por muitos críticos uma obra mestra absoluta por reunir todas as aspirações técnicas e dramáticas, ao ponto de ser a obra indispensável no repertório das companhias clássicas. Seu idealizador, Theophile Gualtier encontrou seu tema perfeito em uma lenda eslava através de uma coletânea de contos alemães escrita por Heinrich Heine. A partir disso criou um libreto imortal que ainda hoje fascina e inspira muitas releituras e interpretações contemporâneas.

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“Giselle” propõe muitas possibilidades as bailarinas que tem a sorte de interpretá-la e mostrar toda a sua versatilidade e capacidade dramática. Em dois atos antagônicos o espectador viaja de um primeiro ato terreno, real, sentimental, para um segundo ato espiritual, etéreo e irreal. O auge do período romântico.

Em 1903, Marius Petipa encenou seu renascimento final e mais importante para a jovem Anna Pavlova, a treinando pessoalmente para o papel. Com seus notáveis saltos e alma, Pavlova estabeleceu um novo padrão para a personagem.

Em suas turnês globais, Pavlova interpretou Giselle inúmeras vezes tornando o ballet mundialmente conhecido e inspirando outras bailarinas, entre elas Alicia Markova que está entre as que a assistiram de perto.

A dor na dança, por Ingrid Silva

Ingrid Silva
(Daniele Akemi/Reprodução)

A bailarina brasileira Ingrid Silva, do Dance Theatre of Harlem, em New York, viveu em sua casa o ballet “The front porch of heaven”, de Ulyces Dove. “Esse ballet significa que nem a morte separaria ele (Ulyces Dove) das pessoas que ele ama. Para mim na época quando eu aprendi esse ballet eu tinha acabado de perder a minha afilhada para a leucemia, por isso, esse ballet foi muito marcante e foi a primeira vez na vida que eu dancei algo que tinha muita conexão comigo. Eu não estava contando a história de ninguém, eu estava contando a minha própria história. Ter fotografado com a Dani a distância foi incrível, ela é super paciente, super doce, inclusive a minha cachorrinha, Frida, estava andando de um lado para o outro querendo ver o que estava acontecendo (risos). Temos que nos adaptar ao que seria o novo normal, as coisas estão mudando, e foi bem diferente, foi a primeira vez que eu fiz uma sessão de fotos à distância, achei maravilhoso”, conta Ingrid.

Ingrid Silva
(Daniele Akemi/Reprodução)

“The Front Porch of Heaven” é uma obra muito mais recente que as outras citadas aqui. Definida para três casais em uniformes brancos e com o subtítulo “Odes to Love and Loss, Dancing on the Front Porch of Heaven” foi coreografado para o Royal Swedish Ballet, em 1993.

Nada melhor do que as palavras do próprio coreógrafo para explicar esse balé: “Para mim, a música de Arvo Pärt pode enviar almas para o céu. Quero contar uma experiência em movimento, uma história sem palavras e criar um monumento poético sobre as pessoas que amei”, disse Ulyces Dove.

Descrito como um coreógrafo de danças meditativas e explosivas, famosas por sua velocidade, força e erotismo. Um homem de fala mansa fora do palco, mas no estúdio, Dove era conhecido como intenso e exigente, que esperava que seus dançarinos dessem tudo o que tinham, incansavelmente, mesmo nos ensaios. Seu trabalho é apresentado por empresas como o Alvin Ailey American Dance Theatre e o New York City Ballet.

Veja o ensaio completo:

 

Créditos:

Concepção, coordenação e texto – Flávia Viana

Curadoria e textos – ballets e personagens escolhidos – Milena Pontes – @tutu4love

Fotos e direção – Daniele Akime

Bailarinas – Claudia Mota

Luiza Lopes

Bruna Gaglianone

Ingrid Silva

Thamiris Prata

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