Com a 1ª foto aos 73 anos, Dona Dodô está se sentindo linda
A colunista Natália Dornellas conta a história de Dona Dolores e sua alegria ao ser fotografada pelo neto em um ensaio lindo
Quem é da geração digital e calibra bem a selfie talvez não entenda o que é nunca ter feito uma foto na vida, nunca ter sido retratada ou coisa parecida, mas a história da dona Dolores pode clarear um pouco.
Nascida na zona rural de Florestal, MG, no ano de 1948, Dolores de Jesus Souza era a única criança preta entre os colegas que tiravam partido de sua branquitude para exigir prendas e favores dela. “Eles pediam e, se eu não fizesse, me batiam e me deixavam para trás no caminho da escola”, conta ela num vídeo que emocionou as redes e mostra sua alegria ao ser fotografada pela primeira vez.
Sua única foto anterior foi feita quando tinha por volta dos 13 anos, “para documento”, mas naqueles tempos ela nem se olhava no espelho, sentia-se esquecida por Deus e por todo mundo. “No meu tempo, era só trabalho, eu vivia sozinha, isolada, tinha vergonha de tudo. Me sentia feia, só servia para fazer serviços, carregar coisas. Eu era como escrava”, disse ainda no vídeo produzido pelo neto Rafael Freire (@rafaelfreiiire), um fotógrafo de mão cheia. Dona Dodô, como é chamada pela família, teve que começar a trabalhar cedo para ajudar na criação dos 12 irmãos e teve uma vida de muita luta, mas nem por isso vive se lamentando.
Diagnosticada com Alzheimer, ela hoje é cuidada pela filha Waneide que quer fazer tudo o que puder antes que a memória da mãe se apague. As fotos desse ensaio e a alegria de se sentir linda, “como uma artista”, certamente ficarão registradas.
*Para ver mais histórias com esta e acompanhar minha “curadoria de avós e avós”, acesse nataliadornellas.com.br ou @nataliadornellas, no Instagram. Ah, e se conhecer personagens que mereçam ter suas contadas, me deixe saber, por favor.