Estávamos eu e mais três amigos – todos homens – batendo papo depois de uma oficina de teatro. Armou-se um temporal e eu lamentei que minha roupa no varal iria molhar. Um deles disse que sua mulher também devia estar muito brava porque tinha lavado um monte de camisas dele.
Comentei que nunca havia lavado roupa de homem. (Na época, eu estava no meu primeiro casamento.) Ele achou muito estranho que meu marido lavasse a própria roupa. Respondi que ele era um grande dramaturgo, um escritor brilhante, ator e diretor muito talentoso e, além disso, tinha uma saúde de ferro. Era, portanto, alguém totalmente apto a lavar a própria roupa; seria até injusto dizer o contrário. Meu amigo ficou calado por um tempo. Perguntei se eles queriam mais uma cerveja, fui buscar e a chuva caiu forte.
Tive certa pena desse meu amigo. Na minha ideia de liberdade, não cabia o fato de ele depender de alguém para cuidar da sua roupa. Se a pessoa tem condições físicas e psíquicas para lavar a própria roupa, por que não o faria?
Então comecei a listar mentalmente os muitos direitos que, com o tempo, foram tomados dos homens. Eles não poderiam ser privados, por exemplo, de cuidar da própria alimentação. Cozinhar é tão bom quanto comer, e saber fazer arroz, feijão, bife, macarrão, salada, suco, legumes refogados e o que mais eles quiserem gera independência e poder.
Buscar as crianças na escola também é um direito do qual os homens não poderiam abrir mão – jamais. Eu não tenho filhos, mas busquei meu sobrinho na escola muitas vezes. Nada se compara à carinha deles saindo com aquela mochilinha nas costas. É a coisa mais linda. Sem contar o luxo que é a conversa a caminho de casa. Homens que ainda não exercem esse direito deveriam lutar por isso.
Cuidar dos filhos é um privilégio que as mulheres e os homens precisam dividir de forma igualitária. Outro dia meu atual marido penteava os cabelos da filha dele. Os dois no grau máximo de uma relação de amor e confiança que só se estabelece com as mãos. Afinal, são as mãos que amam. Esse papo de coração é conversa. E amar não é só botar dinheiro em casa e dar exemplo. Isso é muito velho, já era. Os homens podem mais e sabem disso.
Os homens só não podem fazer duas coisas: gestar e amamentar. Todo o resto – cuidar de si mesmo, dos filhos, da casa, dos pais, do corpo – são seus direitos e devem ser exercidos.
Até mesmo não lavar as próprias roupas é um direito dos homens. Se quiserem usar as roupas sujas, o que podemos fazer? O direito de escolha é deles. Eu estou casada pela segunda vez e nem preciso dizer que continuo não lavando as roupas do meu marido. Ele é forte e não necessita de mim para isso. Até o cuidado com lençóis e toalhas é dividido. E nunca falamos a respeito; não precisa.
Mas uma vez eu recolhi as roupas dele e fiz o jantar. Quando ele chegou, eu estava lendo no sofá. Ele elogiou o cheiro da comida, me beijou e foi para o quarto. Voltou para a sala e disse baixinho ao meu ouvido: “Eu vi a roupa em cima da cama. Obrigado”. Então me deu um beijo bem demorado e o jantar esfriou de tanto esperar.