Sub-representatividade na saúde: olhar para as mulheres é imperativo
Michelle França Fabiani, líder médica na Roche Farma Brasil, fala sobre desigualdade em tratamentos, diagnósticos e acesso à saúde para as mulheres
Ao longo da história, a ciência privilegiou o sexo masculino como padrão de análise na saúde. Até meados do século 20, considerou-se que, se os medicamentos funcionassem nos homens, consequentemente seriam igualmente eficazes para as mulheres.
Análises publicadas em junho de 2021 na revista científica JAMA Network Open ressaltam que o sexo feminino está sub-representado em ensaios clínicos de cardiologia, oncologia, neurologia, imunologia e hematologia. Mesmo com evoluções significativas na ciência, ainda nos dias atuais observa-se uma profunda desigualdade em tratamentos, diagnósticos e acesso à saúde para este grupo.
Inevitavelmente, esse cenário se intensifica nos países menos desenvolvidos: 90% dos casos de câncer de colo de útero – doença 100% prevenível a partir de exames ginecológicos e tratamentos contra a HPV – acontecem em países de renda média e baixa, segundo a OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde).
No Brasil, estima-se que mais de 70% dos casos de câncer de mama sejam diagnosticados em estágio avançado, comprometendo diretamente significativamente as chances de cura e controle da doença.
Jogar luz nesse tema e começar a impulsionar práticas para mudar o ponteiro não é apenas importante, mas urgente. Como médica, mulher e mãe de uma menina de 7 anos, reconheço que os problemas de saúde são complexos demais para que um agente possa resolvê-los sozinhos – sobretudo em questões estruturais, como as que sustentam as iniquidades de gênero no acesso à saúde – mas também acredito que, de forma colaborativa, podemos transformar essa realidade.
Vale citar como exemplo um projeto pioneiro e global muito interessante para inspirar outras empresas, chamado XProject – no qual o X representa o cromossomo feminino. Ele traz novas reflexões para debatermos soluções em busca de melhorias neste contexto de saúde da mulher em todo o mundo.
Trata-se de uma iniciativa da companhia farmacêutica que atuo, Roche, que também espera criar um futuro em que as mulheres tenham a mesma oportunidade de acesso à informação, diagnóstico e tratamentos adequados.
Acredito que ferramentas voltadas à digitalização da saúde nos permitirão garantir mais eficiência à gestão da saúde, reduzindo iniquidades, à medida que também contribuirão com o desenvolvimento de políticas públicas que viabilizem uma melhor jornada de cuidados universais para nós, mulheres.
Para isso, é inegável, que ainda enfrentaremos um árduo caminho no qual precisaremos de mulheres (e homens) comprometidos em fortalecer a legislação em prol da saúde da mulher, seja com a elaboração de novos pleitos, seja em fiscalizar e acompanhar que importantes conquistas sejam mantidas – como o acesso ágil e universal a tecnologias de ponta para o tratamento do câncer de mama e tantas outras doenças que impactam as mulheres.
É tempo de nos debruçarmos sobre as diferenças para compreender melhor a saúde das mulheres, considerando as suas características clínicas e necessidades específicas.
Juntos, teremos a capacidade de derrubar as barreiras sociais e culturais que há séculos impedem mulheres em todo o mundo a ter o básico e fundamental para a vida: a saúde plena.
*Michelle França Fabiani, é líder médica na Roche Farma Brasil