Adriana Barbosa: “Um valor inegociável é não fugir do que me torna uma pessoa real”
A executiva é a nova convidada do videocast Eu, CEO, criado por CLAUDIA para destacar mulheres em cargos de liderança e gestão
Adriana Barbosa é uma das principais referências da economia criativa no Brasil. Em 2002, ela fundou a Feira Preta, hoje considerada o maior evento de empreendedorismo negro da América Latina. A iniciativa nasceu de sua percepção sobre a ausência de espaços que celebrassem e impulsionassem o trabalho de artistas não brancos – e, claro, rapidamente se transformou em um movimento potente de visibilidade e geração de renda dentro da comunidade.
Sob sua liderança, o evento se expandiu para além dos estandes: hoje envolve também programas de aceleração, formação e apoio a empreendedores negros, fortalecendo uma cadeia produtiva sustentável e transformadora.
Adriana tem um compromisso profundo com a representatividade e com a construção de um futuro mais diverso e equitativo. Por isso, a executiva é a nova convidada do videocast Eu, CEO, criado por CLAUDIA para destacar mulheres em cargos de liderança e gestão.
Para conferir o episódio na íntegra, assista ao canal Veja+, disponível gratuitamente no Samsung TV Plus (canal 2075), hoje às 19h, ou acesse nosso canal do YouTube.
Abaixo, confira a entrevista completa:
Vou começar falando da palavra CEO, que você não a utiliza. Por quê?
A palavra CEO tem uma tradução que vem imbuída da cultura norte-americana. E eu gosto do Brasil. Gosto do português, gosto da nossa língua. E falo que parto de uma perspectiva decolonial, que é um movimento de pessoas que pensam os nossos processos a partir de muitos pontos de vista, e não só do ponto de vista do norte global. Tem a ver com um posicionamento político de olhar para a nossa cultura.
No Manifesto da Feira Preta, tem um provérbio africano: “Até que os leões contem suas próprias histórias, os caçadores serão sempre os heróis.” Qual é a importância de uma voz como a sua nesse papel de liderança feminina?
Quando eu comecei, nem tinha noção que chegaria mais de duas décadas fazendo o que faço e tendo essa amplitude. Não só no Brasil, mas internacionalmente. Não sabia que chegaria até aqui, nunca imaginei. Hoje, quando eu olho para trás e fico pensando em cada sementinha e cada tijolo que foi sendo colocado, vejo que é uma história muito bonita. Eu celebro essa história e não é uma história só minha porque ela tem um cunho coletivo.
Vejo todos os processos de transformações que foram acontecendo ao longo das duas últimas décadas e como essa iniciativa foi se dialogando com o tempo. Quando começou, era um contexto racial, de luta pelos direitos civis no Brasil. Hoje é um outro contexto, nos modernizamos a partir dessa história.
Você passou por uma retomada da história da marca no final do ano passado. Mas como foi esse processo de voltar à história e entender o que precisava ser valorizado?
Quando a feira completou 15 anos, quebramos financeiramente. Foi um fracasso. Fiquei um ano tentando entender os porquês. E um deles era que aquilo que a gente tinha construído – visão, missão, propósito – a gente já tinha cumprido. E era necessário repensar a nossa trajetória e a nossa entrega para o mundo. Ficamos numa jornada de 2017 até hoje nesse processo de reflexão frente ao contexto do presente.
No ano passado, o time foi para a Fazenda da Serrinha, um lugar incrível na Serra da Mantiqueira, para repensar a nossa teoria da mudança. Foi quando conseguimos pensar como nos projetamos para o futuro diante desse novo contexto racial. Nos últimos anos, a pauta esteve mais presente. Então não dava mais para pensar as nossas estratégias com a fotografia do passado. Era preciso se projetar para o futuro, mas esse futuro deve ser feito no presente.
Qual a importância de falar sobre as dificuldades e quais são os aprendizados que vão sendo trazidos por elas?
A gente tem uma cultura no Brasil de romantizar o empreendedorismo e o sucesso. De achar que a vida de um empreendedor é só meteoro e ascensão. E, na verdade, o contexto traz muitos desafios para quem empreende, sobretudo para uma mulher. Normalmente, sempre me chamam para falar dos sucessos. Mas minha vida tem muito altos e baixos. E os fracassos me construíram, me ajudaram a construir essa minha jornada.
E não seria generoso se eu não pudesse contar uma parte dessa história. Porque essa história me ajuda a errar menos. Se falo para você não ir lá porque você vai cair, pelo menos alguém teve a oportunidade de falar. Obviamente não estou romantizando o fracasso. Mas é um lugar onde posso falar tudo o que vivi e o que senti, além de mostrar que é possível sair. A gente precisa colocar as nossas vulnerabilidades na mesa.
Vocês não só cresceram muito ao longo dos anos, ainda que tenham tido desafios, como têm planos ainda de ser a maior feira do mundo. Qual é a importância de reafirmar esse desejo?
Comecei vendendo as minhas roupas em feiras de rua, não imaginei que chegaria onde a gente chegou. Ao longo dessa trajetória, fui construindo um lugar que sai de uma perspectiva individual de sobrevivência para ir para uma perspectiva coletiva de pessoas que estavam, como eu, tentando sobreviver. À medida que eu fui avançando nessa construção, entendi o processo sistêmico de como as coisas acontecem, como elas se desenvolvem politicamente no mercado, na sociedade civil, consumo, empreendedor.
Hoje, o nosso trabalho tem expansão em outros países. Na semana passada, recebemos um convite da vice-presidenta da Colômbia para que a gente pudesse mostrar a nossa experiência para ser replicado naquele país. Esse ano, não conseguimos fazer a Feira Preta por falta de patrocínio. Mas, ainda assim, não deixo de sonhar.
Quando a gente fecha os olhos ou pede para a inteligência artificial gerar a imagem de uma alta liderança, geralmente vem um homem branco, de gravata, com um sapato X ou Y… Quando a gente consegue criar esse outro imaginário, abrimos outra possibilidade de um sonho. Como isso te impactou na sua própria trajetória pessoal?
A gente fez uma pesquisa em cinco países da América Latina sobre empreendedorismo negro. E em todos esses países, Argentina, Panamá, Peru, Colômbia, Brasil, 80% desses empreendedores são mulheres negras. Então, construir esse imaginário do que é alta liderança é trazer para essas mulheres que, sim, elas são as tomadoras de decisão da empresa delas e que, se isso estiver no horizonte, isso vai ser construído de maneira mais pragmática.
Eu adoro essa construção de imaginário, porque isso muda o ponteiro. A gente trabalha com educação empreendedora, faz investimento e acesso a crédito. Temos dois espaços físicos de inovação social. Produzimos dados. Isso vai criando uma onda de ressonância e de fortalecimento de identidade.
Quais são os valores que uma grande líder precisa ter para poder inspirar e fazer transformações benéficas não só para si, mas também para todo o seu entorno?
Uma questão que eu fui aprendendo ao longo do tempo é você ter muita clareza do que você quer – o que a gente chama de propósito. Qual é a sua vocação? O que você coloca para o mundo? Qual é essa energia que faz você levantar da cama todos os dias? Então isso precisa estar muito fortalecido e tem que estar muito presente para não se desvirtuar. Isso porque, para você chegar num processo de burnout é muito fácil.
Sabemos que há muitas mulheres adoecidas porque, de alguma forma, você vai se distanciando desse lugar de o que conecta com a sua vida, do que faz seu coração vibrar. Um valor inegociável é não fugir do que me torna uma pessoa real.
O quanto você sente que a maternidade também traz aprendizados para o empreendedorismo e para a liderança?
Sou mãe solo e minha filha esteve comigo desde o começo da feira. Ela vivencia o meu ambiente de trabalho. Há essa questão de conciliar, mas ela sempre me puxa para esse equilíbrio da dimensão pessoal e da dimensão profissional.
Eu achava que antes eram caixinhas isoladas, mas as coisas vão se misturar, elas vão se atravessar. A minha filha ouve, aí, às vezes, ela palpita. Então, se eu permito que ela participe dessa jornada, obviamente ainda como uma criança, a gente vai aprendendo juntas.
Você sente que ela olha para você como um exemplo?
Essa geração já está lá na frente! Ela traz questões na escola dela porque sempre sonhou desde pequena em ser presidenta do Brasil. No primeiro momento, pensei que ela estava viajando, que loucura! Mas depois eu pensei: por que não? Se eu sonho tanto, por que ela não pode sonhar em ser presidenta? E ela vai trazendo essa perspectiva no ambiente da escola.
Qual é um sonho que você tem e queira que seja realizado em cinco ou dez anos?
Um sonho é que a gente tenha mais mulheres negras em cargos de liderança ocupando qualquer lugar onde ela deseja estar. Assim como a minha filha sonha aos 12 em ser presidenta que as mulheres, as meninas que estão começando por mais dificuldade que elas tenham que elas sonhem em assumir esses lugares de liderança.
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