Dedo podre? Entenda por que você só se apaixona pelo mesmo tipo de pessoa
Não é uma maldição irreversível! Psicólogas explicam como núcleo familiar e busca pelo caminho mais fácil geram padrões amorosos repetitivos.
Está na hora de baixar a guarda e ser sincera com você mesma, amiga. Em algum momento (talvez até agora mesmo!), você já sentiu que todas as pessoas com quem você engatou um relacionamento são parecidas? Se sim, saiba que a psicologia tem uma ampla explicação para isso.
Normalmente, esse sentimento aparece quando percebemos que o (ou a) crush tem os mesmos defeitos que o anterior. Afinal, quem nunca ouviu da amiga (ou de si mesma): “meu Deus, que dedo podre!”, né? Mas calma, porque há uma razão psicológica por trás disso e não é simplesmente uma maldição que você acredita carregar consigo.
O problema começa dentro de casa
De acordo com a psicóloga Louise Quintella, especialista em terapia cognitivo-comportamental e dona da página ‘Querida Psicóloga’ no Instagram, os padrões amorosos repetitivos são consequências do tipo de criação que tivemos em casa. Isso significa que a maneira como a nossa família nos apresenta o amor é um fator decisivo na maneira como lidaremos com esse sentimento ao longo da vida.
“Se você é de uma família muito rígida, é possível que você crie crenças de desvalor e, como meio de compensar essa percepção de si, se torne uma pessoa muito autocrítica e perfeccionista. Ao mesmo tempo, se você vem de uma família sem muitos limites, você cria crenças de desamparo, e a forma que o nosso cérebro arranja de lidar com isso é através da autorresponsabilidade exacerbada, ou seja, acredita que se você não tomar a frente, ninguém tomará. Já se você é de uma família dominadora e é constantemente reprimida, é provável que tenha crenças de inadequação e de que não merece ser amada, criando crenças de desamor”.
Também tem a ver com controle
Já a psicóloga Letícia Frois, também especializada na área cognitivo-comportamental, pontua que continuar a escolher relações com padrões comportamentais semelhantes tem a ver com a necessidade do ser humano de repetir o mesmo hábito, porque isso é mais confortável para o cérebro.
“Nós somos criaturas de hábitos. Gostamos de rotinas e comportamentos familiares, mesmo quando eles nos perturbam. Então, nós os repetimos. Freud chamou essa necessidade de repetir uma experiência familiar, apesar das consequências desagradáveis, de “compulsão à repetição”. Ele acreditava que era causada por uma pulsão de natureza física e psicológica. Recentemente, a neurociência apresentou a mesma explicação”.
A psicóloga explica que a “pulsão de natureza física” está ligada à neurologia, que descobriu recentemente que os neurônios gostam de caminhos familiares, assim como a psique humana e as emoções. Isso significa que as atitudes reconhecidas como frequentes, e isso inclui ações ruins, são repetidas em looping para que o cérebro gaste menos energia e se mantenha estável.
Já a parte psicológica está ligada à necessidade de poder, mas também sobrevivência, segundo Letícia. Isso significa que uma pessoa tem a mesma atitude ruim, várias e várias vezes, porque acredita que em algum momento ela terá controle sobre a situação e conseguirá transformá-la em algo bom. Só que, muitas vezes, o resultado não é esse e a pessoa só continua a ter um padrão comportamental negativo.
A repetição leva à autossabotagem
Com uma relação familiar conturbada e o cérebro pronto para sempre se envolver em relacionamentos tóxicos, uma chavinha contraditória é ligada. De alguma forma, você passa a acreditar que o que as pessoas dizem a seu respeito é verdade e que está fadada a relações ruins.
Além de sempre se envolver com alguém que diminuirá você – o que aumenta a sensação de que o dedo podre é real -, quando o padrão é mudado há uma grande dificuldade em reconhecer isso. Assim, relações potencialmente boas podem ser minadas.
“Se temos uma crença de desvalor, de se sentir inferior, tendemos a entrar em relacionamentos que nos façam sentir desse jeito. Afinal, em algum nível, acreditamos que isso é verdade. Se acreditamos que as pessoas não são confiáveis, mesmo se a pessoa mais confiável e apaixonada do mundo estiver na nossa frente, não vamos conseguir reconhecer isso. Até o momento que isso fica tão insustentável, que a pessoa decide ir embora”, pontua Louise.
A partir desse divisor de águas, a psicóloga enfatiza que é essencial olhar para dentro para entender o porquê de ter dado errado, já que era uma relação diferente das anteriores. Infelizmente, esse momento de conflito consigo mesma provavelmente não será fácil, porque pode ser a consciência no seu estado mais cru – mostrando que o término não é só por causa do outro.
“Tendemos a culpar os outros sobre os nossos problemas, mas muitos deles podem sim ser causados por nós mesmos, e não tem nada de errado em admitir isso. Somos seres humanos, somos falhos. Mas quando nos recusamos a olhar para isso, é aí que as crenças ficam mais rígidas e, consequentemente, o padrão comportamental também e isso desestrutura qualquer relação, não somente amorosa”, esclarece Louise.
Não procurar ajuda é cruel com você mesma
Se as relações terminam sempre da mesma forma, uma hora fica insustentável pensar que a culpa é só do outro. Com isso, a autopunição costuma vir à tona quando os desfechos dos relacionamentos são sempre os mesmo. É como se fosse uma eterna confirmação de que o problema está em nós.
Com o sofrimento presente, a repetição de padrões comportamentais negativos também impede a vivência de experiências diferentes e positivas. Ou seja: o seu cérebro não consegue mudar a forma de resposta diante de uma determinada situação (normalmente ruim), o que gera um ciclo vicioso negativo. E o pior: muitas vezes, tudo isso acontece de forma inconsciente.
“Ficamos tão imersos em traumas e feridas passadas que não damos abertura para olhar por outro prisma, nos direcionando sempre para o mesmo lugar e nos aprisionando emocionalmente. Esses comportamentos também acabam por afastar pessoas que seriam realmente boas para a gente, por não entendermos que, antes de amar e aceitar alguém, precisamos nos amar e nos aceitar. E isso inclui olhar para as partes não tão legais assim também. E por último, mas não menos importante, não nos permitimos rever essas crenças e criar novas ou reestrutura-las para criar padrões mais saudáveis”, explica Louise.
Reconhecer essas construções negativas dentro de si pode ser um caminho solitário e extremamente complicado de trilhar, como enfatiza a psicóloga. Por isso, ao começar a abrir os olhos para essas situações de conflito interno, é essencial saber que está tudo bem se você pedir apoio.
“Muitas vezes, a gente reconhece que algo não está bem, mas não conseguimos agir de outro jeito. Por isso, é importante saber a hora de pedir ajuda à um profissional qualificado. O psicólogo seria o profissional ideal para auxiliar nessa caminhada”, finaliza Louise.